XV Domingo do Tempo comum
( Is 55, 10-11; Sl 64; Rm 8, 18,23; Mt 13, 1-23)
Que sementes lançamos no mundo? Que valores deixamos para outras gerações? Com que significados marcamos a vida das pessoas que nos cercam? Que sementes estamos espalhamos ao nosso redor? Com estas perguntas iniciamos nossa meditação deste final de semana. A ideia central está mais nos sinais que vamos deixando no caminho, do que nos grandes conteúdos que possuímos. Lembro sempre de minha catequista. Uma jovem dedicada e simples. Ela não tinha lá muita erudição teológica. Naquela época os (as) catequistas não se preparavam tanto, não havia à disposição como hoje tantos cursos de formação catequética e pastoral. No entanto, jamais a esqueci. Há décadas que não a vejo, mas nunca esqueço o que ela com muita simplicidade e generosidade semeou durante dois anos em mim.
Bem mais do que conteúdos (que são muito importantes), lembro mesmo é de sua dedicação e do amor com que transmitia aqueles primeiros conteúdos da fé cristã para nós, um grupo de pré-adolescentes dando nossos primeiros passos na fé.
Este momento de minha vida, com certeza é lugar comum de muitas experiências iguais. E está em perfeita sintonia com a liturgia deste final de semana, pois revela a força da Palavra de Deus que como em Isaías: “ a palavra que sair da minha boca: não voltará vazia; antes, realizará tudo que for de minha vontade e produzirá os efeitos que pretende ao envia-la” (Is 55,11).
Neste domingo o evangelho fala da parábola do semeador. É um texto belo, simples de compreender e profundo. Jesus entrou em uma barca e grande multidão reuniu-se em sua volta e começou a ensiná-los. Interessante pensar esta forma de “mesa da palavra” que Cristo se utiliza: a barca, símbolo mais antigo da Igreja, diante de uma multidão que ficava de pé na praia ( Mt 13,2). É um belo símbolo da Igreja, e de nossas assembleias dominicais. Às vezes não sabemos quem nos ouve, seus nomes ou até mesmo como ecoa a Palavra em suas vidas, mas é dever nosso sempre proclamá-la como é um dever do semeador, semear, ainda que não possa medir como serão os frutos de sua colheita.
A parábola inicia com a imagem de um semeador saindo a lançar suas sementes. Enquanto semeava quatro foram os locais em que caíram suas sementes. No texto são 4 tipos de solo. Uma à beira do caminho, umas em solo pedregoso, algumas em solo espinhoso e também em terra boa. Há neste texto alguns elementos que favorecem o semeador, por exemplo o fato de sempre sair e semear; e, claro, a força própria da semente, que é a Palavra de Deus. Mas há também alguns fatores que lhe são antagônicos, como por exemplo a qualidade do terreno em que teve de semear. A parábola do semeador revela que para que a semente dê os frutos esperados é importante a qualidade do terreno em que a semente foi lançada. É claro que cada terreno expresso no texto bíblico remonta a nós ouvintes situações especificas da vida, revela que o terreno deve ser profundo, para que a semente encontre mais possibilidades de gerar cem, sessenta e trinta frutos por semente (Mt 13,9).
Mas sabemos também que estes solos são metáforas de nossa vida ou melhor de nossa capacidade de acolher a boa semente da Palavra. E como se apresentam estes terrenos, assim, muitíssimas vezes também nos apresentamos. Quem já não sentiu que existem muitas forças querendo “roubar” de nós a Palavra de Deus? São Paulo, na Carta aos Efésios declara que: “nossa luta não é contra os homens, mas contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo das trevas” (Ef 6,11). Não sejamos inocentes ou ingênuos, mas o inimigo de Deus está aí, rondando aqueles sedentos da escuta da Palavra, para tirá-los do caminho do Senhor. Quem já não experienciou alguma vez na vida, sua alma assemelhar-se a um solo pedregoso e sem profundidade? A semente foi recebida com alegria, mas os sofrimentos e a sensação de deserto espiritual não permitiram que a semente desse frutos. Quem de nós recebeu a Palavra como que entre os espinhos? Quem já não passou por sufocos em sua vida? Quem de nós já não teve a sensação de estar oprimido ou deprimido cercado por espinhos, sem ar para respirar? Quem de nós já não se deixou iludir pelas riquezas sufocando o dinamismo da Palavra de Deus.
Todas estas imagens são sinais de algo que está no outro lado do semeador. De uma realidade presente na vida de seu interlocutor. Para o semeador é claro que esta realidade é um solo ainda não fecundo para a colheita dos frutos. No entanto para os pregadores, os catequistas, os semeadores da Palavra, do outro lado de sua semeadura está o problema do mal: aqui na parábola se apresenta como nas tentações sob três manifestações: No demônio que quer roubar a Palavra de Deus em nós; no mistério da iniquidade e tentações e por fim no mistério do sofrimento.
Mas todas elas apontam também para realidades que precisam ser superadas em cada um de nós.
O apóstolo Paulo na Segunda leitura é extremamente positivo quanto a isso: Em relação ao mistério do sofrimento ele afirma: “eu entendo que os sofrimentos do tempo presente nem merecem ser comparados com a glória que deve ser revelada em nós” (Rm 8,18). Há aqui algo que precisa ser integrado em nós. Vivemos uma ditadura do não sofrer. Não se pode mais sofrer na vida. Algumas religiões até proíbem que isso aconteça a seus fiéis comparando o sofrimento humano a um castigo de Deus. Paulo, pelo contrário, entende e acolhe o sofrimento, mas sabe que algo bem maior há de se manifestar em nós. Paulo ainda fala sobre o mistério da iniquidade e que este também será superado: “ pois a criação ficou sujeita à vaidade, não por sua livre vontade, mas por vontade daquele que a sujeitou, também ela espera ser libertada da escravidão e corrupção para, de fato, participar da glória dos filhos de Deus” (Rm 8,20). O mistério da iniquidade foi vencido na morte de Cruz de Cristo. Naquela semente que caiu na terra, morreu e deu muitos frutos, surgiu uma árvore esplendorosa que é sua Igreja. Ela continua a semear esta Palavra na terra.
Voltemos agora ao semeador. Ele ainda há de encontrar terrenos hostis à Palavra de Deus, mas continuará semeando sempre. Pois no final de tudo, quando Deus será tudo em todos (1Cor 15,16), veremos com os olhos purificados da fé que valeu muito a pena lançar a Palavra.
Valeu a pena a simples semeadura de minha primeira catequista, que semeou mais com o coração, sem saber o que um dia seria colhido!
Pe. Osmar Debatin – Diocese de Rio do Sul
(Com pequenas adaptações, apenas ortográficas, de Pe. Raul Kestring)