Nossa Senhora do Caravagggio – Pe. José Artulino Besen

Joanita, diante do imperador de Constantinopla João VIII Paleólogo – vitral em Azamabuja, Brusque

O peregrino ou devoto que entra no Santuário de Azambuja, em Brusque, tem a graça de contemplar, no alto do altar-mor, o belíssimo conjunto com as imagens de Nossa Senhora e Joanita, retratando a aparição ocorrida em 1432 na cidade italiana de Caravaggio. Foi essa a devoção que os primeiros habitantes de Azambuja trouxeram da Itália: a companhia de sua “Madonna” foi o melhor consolo para as peripécias de uma longa viagem e a saudade na nova terra. Nossa Senhora de Caravaggio fazia-os recordar sua terra, suas devoções, os amigos lá deixados.

Transcrevemos, a seguir, a mais antiga narração dessa aparição mariana que é, ao mesmo tempo, a narração oficial:

“Deus, rico de misericórdia e todo-poderoso, que tudo dispõe suavemente com sua providência, com aquela piedade que nunca deixa nenhum fiel realmente privado de seu celeste socorro, num dia aprouve-lhe olhar, socorrer e inclusive honrar o povo de Caravaggio com a aparição da Virgem Mãe de Deus.

No ano de 1432 do nascimento do Senhor, no dia 26 de maio às 5 horas da tarde, aconteceu que uma mulher de nome Joanita, oriunda do povoado de Caravaggio, com 32 anos de idade, filha de um certo Pietro Vacchi e esposa de Francesco Varoli, conhecida de todos por causa de seus costumes virtuosíssimos, sua piedade cristã, sua vida sinceramente honesta, tendo cortado o capim para seus animais fora de Caravaggio ao longo da estrada que dá para Milão, estava totalmente preocupada em como levar para casa aqueles feixes de capim. [Como o marido era muito violento e costumava espancá-la, tinha receio de atrasar-se e, com isso, ser castigada].

Foi então que viu uma Senhora belíssima e admirável, de estatura majestosa, rosto gracioso, aparência veneranda e de indizível e nunca vista beleza física, vestida com hábito azul e tendo a cabeça coberta com um véu branco, vinda do alto e parar exatamente vizinha a ela. Tocada pelo aspecto de tal modo venerável da nobre Senhora, estupefata, Joanita exclamou:

— “Virgem Maria!”

E a Senhora disse-lhe:

— “Não temas, filha, porque sou realmente eu. Pára e ajoelha-te para rezar”.

Joanita respondeu:

— “Senhora, agora não tenho tempo. Os meus jumentos esperam este capim”.

Então a beatíssima Virgem falou-lhe novamente:

— “Agora faz o que eu quero de ti…”

E assim dizendo, colocou a mão no ombro de Joanita e fê-la ajoelhar-se. Retomou a palavra:

— “Escuta bem e não esqueças. Quero que contes por toda parte por onde puderes com a tua boca ou faças os outros dizerem isto…”.

E com lágrimas nos olhos (que, segundo o testemunho de Joanita,  a ela pareceram como ouro brilhante) acrescentou:

— “O Altíssimo onipotente meu Filho queria destruir esta terra por causa da iniqüidade do povo. A cada dia mais fazem o que é mau, e caem de pecado em pecado; mas eu, por sete anos, pedi a meu Filho que tivesse misericórdia de seus pecados. Por isso, quero que tu digas a todos e a cada um que jejuem a pão e água cada sexta-feira em honra de meu Filho, e que celebrem cada sábado, após as vésperas, por devoção a mim: devem me dedicar aquele meio-dia como reconhecimento pelos muitos e grandes favores alcançados de meu Filho por minha intercessão”.

A Virgem Senhora dizia todas estas palavras com as mãos abertas e como que preocupada. Joanita disse:

— “Ninguém acreditará em mim”.

Respondeu a clementíssima Virgem:

— “Levanta-te e não temas. Tu, conta o que eu ordenei; eu confirmarei as tuas palavras com tão grandes sinais que ninguém duvidará de que disseste a verdade”.

Tendo dito isso e feito o sinal-da-cruz sobre Joanita, desapareceu a seus olhos.

Retornando imediatamente a Caravaggio, Joanita contou tudo o que tinha visto e ouvido. Por isso muitos, acreditando nela, começaram a visitar aquele lugar e ali viram uma fonte que antes ninguém tinha visto. A partir disso alguns doentes e, sucessivamente, cada vez mais numerosos, se dirigiram àquela fonte confiando no poder de Deus. Deste modo difundiu-se a notícia de que os doentes retornavam livres das enfermidades de que sofriam por intercessão e pelos méritos da gloriosíssima Virgem Mãe de Deus e Senhor nosso Jesus Cristo. A Ele, ao Pai e ao Espírito Santo seja sempre o louvor e a glória pela salvação dos fiéis. Amém”.
Os imigrantes italianos em Santa Catarina – Azambuja e Caravaggio

Santuário de Nossa Senhora do Caravaggio em Azambuja.

No lugar onde a Virgem apareceu a Joanita brotou uma fonte de água que jorra a até hoje.

Esses acontecimentos logo foram submetidos ao exame do bispo de Cremona, que aprovou a construção de uma capela autorizando a colocação da primeira pedra.

De tal modo se espalhava a notícia da aparição de Maria, das peregrinações que se organizavam para visitar os local sagrado, que o próprio imperador bizantino João VIII Paleólogo pediu e obteve um encontro com Joanita. O imperador se encontrava em Florença participando do Concílio Ecumênico que buscava a reunificação da Igreja católica com a ortodoxa.

Em novembro de 1433, o Duque de Milão Filipe Maria Visconti dotou-a de uma capelania para a celebração de uma missa cada sábado. Desde o início, as obras que se seguiram à Aparição e os sinais que a confirmaram foram não só a casa de oração mas também um hospital para os pobres e doentes e uma casa de acolhimento para a infância abandonada: órfãos a serem adotados e aos quais se deveria ensinar a escrever e uma profissão, jovens para serem acompanhadas e dotadas até a idade das núpcias.

A história do Santuário está toda contida nestes inícios:

♦ uma mensagem, mandada por Deus aos homens através de uma manifestação de amor materno da Mãe do Redentor;

♦ uma fonte de graças para a cura interior e física da humanidade enferma;

♦ um lugar de oração, ao qual se vai em peregrinação para escutar as palavras essenciais do Evangelho e para invocar a misericórdia do Senhor;

♦ um lugar do qual se retorna renovados no espírito e no corpo e comprometidos com a realização das obras de misericórdia e de amor ao próximo, que são a substância de uma vida autenticamente cristã.

Santuário de Nossa Senhora do Caravaggio, em Nova Veneza, SC

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Caravaggio simboliza um renovado apelo materno a retornar a Cristo e ao Evangelho que em todos os tempos inclui a comunhão e a unidade visível entre os cristãos, a reconciliação entre os povos e a recomposição de relações pacíficas entre famílias e pessoas, a centralidade reconhecida e doada aos sofredores, aos doentes, aos pobres na Casa de Deus e na comunidade humana: numa palavra, toda a vida é para ser vivida numa fé que se faz oração e caridade eficaz.

Muitos títulos já foram dados a Nossa Senhora. Alguns de forma oficial, depois de longos estudos ou declarações. Outros surgiram de forma espontânea. Nasceram da piedade popular, isto é, do desejo do povo de homenageá-la, uma vez que é mãe e intercessora.

Além de muitas capelas, em Santa Catarina foram erguidos dois Santuários marianos em honra de Nossa Senhora de Caravaggio: um, em Azambuja, Brusque, e outro, em Caravaggio, Nova Veneza. São fruto dos imigrantes italianos ou de seus descendentes que, neles, pedem a graça do atendimento às súplicas e recordam suas origens religiosas e familiares na Itália.

A cada ano, em 26 de maio, os devotos celebram a aparição de 1432.

Pe. José Artulino Besen

Fonte: Site do autor

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