«Eu vim a este mundo para proceder a um juízo: de modo que os que não vêem vejam»
«Fez lama com a saliva e ungiu-lhe os olhos». E a luz jorrou da terra, como no começo, quando […] as trevas cobriam o abismo e o espírito de Deus Se movia sobre a superfície das águas. Deus disse: «Faça-se a luz» e a luz foi feita (Gn 1,2-3). Assim, curou um defeito que existia desde a nascença, para mostrar que Ele, cuja mão terminava aquilo que faltava à natureza, era Aquele que, com a Sua mão, tinha dado origem à Criação, no princípio. E como se recusavam a crer que Ele era antes de Abraão (Jo 8,57), provou com esta ação que era o Filho d’Aquele que, com a Sua mão, «formou o homem do pó da terra» (Gn 2,7).
Ele fez isso para aqueles que procuravam os milagres a fim de acreditarem: «Os judeus pedem sinais» (1Cor 1,22). Não foi a piscina de Siloé que abriu os olhos ao cego, tal como não foram as águas do Jordão que purificaram Naamã (2Rs 5,14): foi a ordem do Senhor que realizou tudo. Mais do que isso, não é a água do nosso batismo, mas os nomes da Trindade que se pronunciam sobre ela que nos purificam. Ele ungiu-lhe os olhos com lama, para que os fariseus pudessem limpar a cegueira do seu coração. […] Aqueles que viam a luz física foram conduzidos por um cego que via a luz do espírito; e, na sua noite, o cego era conduzido por aqueles que viam exteriormente, mas que eram espiritualmente cegos.
O cego lavou a lama dos seus olhos e viu-se a si próprio; os outros lavaram a cegueira do coração, e examinaram-se a si mesmos. Assim, ao abrir exteriormente os olhos dum cego, Nosso Senhor abria secretamente os olhos de muitos outros cegos. […] Nestas poucas palavras do Senhor estavam escondidos tesouros admiráveis e, nesta cura, estava esboçado um símbolo: Jesus, o Filho do Criador.
Santo Efrém (c. 306-373), diácono na Síria, Doutor da Igreja
Comentário do Diatesseron, 16, 28-31 (a partir da trad. SC 121, pp. 299ss.)